Yashin com a taça da Eurocopa 1960 ao lado de Viktor Ponedelnik. |
Diferentemente dos países ocidentais, a Rússia não se preocupou em profissionalizar seu futebol tão rapidamente na primeira metade do século XX. Tendo o primeiro campeonato soviético sido disputado em 1936 e com pausa em 1940 para retornar em 1945, o futebol era um esporte amplamente difundido que arrebatava milhares de torcedores aos estádios. Apesar disso, os esportes na URSS sempre seguiram a linha do amadorismo, como forma de não capitalizar a prática esportiva. No futebol soviético, cada clube era representado por uma instituição social. O CSKA Moscou surgiu do Exército desde os tempos do czarismo. O Zenit Leningrado surgiu de uma fábrica, o Lokomotiv Moscou dos ferroviários e por assim se seguia. Sendo assim, cada seguimento da sociedade estava representado no futebol.
Foi na década de 50 que o futebol soviético se projetou para o mundo. Em 1958 o selecionado da URSS participou pela primeira vez da Copa do Mundo. A seleção soviética caiu nas quartas-de-finais para a anfitriã Suécia que viria a ser a finalista contra o Brasil naquele ano. A campanha por sua vez não foi tida como das mais agradáveis, mas ainda assim abriu os olhos do mundo para o futebol na república socialista. No ano seguinte, com base neste 'insucesso' e numa derrota por 5 a 0 para a Inglaterra, foi difundindo um burburinho na imprensa francesa de que o craque brasileiro Didi estaria sendo cogitado para treinar os soviéticos. A verdade porém era que somente os franceses cogitavam o Folha Seca, pois os soviéticos desmentiram através de jornal Konsomolskaya Pravda.
"Nós não praticamos o comércio de homens e nossos campeões e nossos jogadores sabemos formá-los nós próprios sem precisar de Didi"
Acabou que de fato Didi teve uma proposta para ir a Rússia no ano de 1959. Mas para fundar uma escola de futebol e dar prosseguimento a ela. Outra proposta surgiu para ele vindo da Suécia, porém alegava que a da Rússia era melhor. O príncipe etíope de rancho não acabou enfrentando nenhum dos destinos.
Alguns atletas soviéticos tinham um pequeno interesse pelo futebol profissional, mas ainda assim não se queixavam do futebol na URSS. É o caso do craque Nikita Simonyan. Ídolo do Spartak Moscou, Symonian certa feita disse em entrevista a Revista do Esporte (revista de publicação brasileira): "Para os países que já superaram a fase do amadorismo, é muito bom. Caso contrário, não. Apesar de não poder queixar-me, gostaria de experimentar o profissionalismo, mas dificilmente ele entrará na Rússia, pois os esportes amadoristas são a alegria de centenas de patrícios meus. Jogamos apenas por amor ao esporte: o dinheiro nós o recebemos através de bolsas de estudos. É adorável a vida do atleta na União Soviética.".
Nikita Simonyan pelo Spartak Moscou contra o Torpedo nos anos 50. |
Além das bolsas de estudos, citadas por Simonyan, os atletas de equipes de futebol, que costumavam trabalhar nos seguimentos de seus clubes, tinham algumas pequenas regalias. Segundo Cuesarev, zagueiro do Dínamo Moscou que trabalhava como eletricista, os atletas tinham folgas do trabalho, descansos, tratamentos e outras coisas. E diferentemente do futebol á brasileira, não tinha-se os famosos bichos (premiações em dinheiro quando se obtém um resultado esperado numa partida). As transações de jogadores para outras equipes por sua vez, acontecia entre o fim de um campeonato e o começo de outro, tendo sempre um mês específico para isso. Assim as transferências não aconteciam durante as competições. O passe dos atletas também não existia. No Brasil, os passes dos jogadores na maioria dos casos pertenciam aos clubes. Na década de 70, entre os dez supercraques, somente Afonsinho detinha o próprio passe.
O Spartak Moscou chegou a jogar uma temporada no Brasil por volta de 1960. Perguntado sobre trocar o futebol de sua terra natal pelo da América do Sul, o goleiro espartaquista Valentin Ivamin respondeu: "É melhor jogar na URSS. Todos ajudam para nós jogarmos sempre bem. Jamais pensei em jogar futebol em outra terra que não a minha. Não sei também se me adaptaria a vida de profissional. Prefiro continuar recebendo os aplausos desinteressados de meus conterrâneos.".
O goleiro Ivamin do Spartak Moscou cumprimenta Henrique do Flamengo em jogo no Maracanã. (Créditos: Revista do Esporte) |
Diante disso tudo, o futebol soviético chegaria em 1960 ao seu maior feito. No ano em que foi inaugurada a Taça das Nações Europeias, competição conhecida hoje como Eurocopa, a URSS se sagraria a primeira seleção campeã do torneio. O selecionado soviético contava em seu elenco com Lev Yashin, Igor Netto, Slava Metreveli, além de outros renomados futebolistas.
O craque Igor Netto, segurando a taça da Eurocopa puxa a fila do selecionado soviético. |
Em 1961, Nikolai Romanov, presidente do Conselho Central do organismo supremo do esporte soviético, chegou a propor no COI (Comitê Olímpico Internacional) uma nova definição de amador, que seria: "Amador é todo esportista para o qual o esporte não é um meio de subsistência". Naquele ano o futebol da URSS voltou a passar por maus bocados, mas se classificou para a Copa de 1962, na qual perdeu novamente para a seleção anfitriã, o Chile, nas quartas-de-finais.
Produzindo muitos craques, inclusive no gol, o futebol na Rússia soviética, estando bom ou meeiro (ruim não esteve), sempre levou o público aos estádios. Os ingressos na década de 60 custavam 18 rublos (em conversão para a época, pouco mais de um dólar).
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