Em Noite de Corinthians e Santos a ditadura matou Marighella

Folha de São Paulo, 5 de novembro de 1969.

 Há 105 (106) anos atrás nascia em Salvador o ex-guerrilheiro Carlos Marighella. O baiano que viera ao mundo numa terça-feira, deixaria o mesmo em outra terça, algumas décadas distantes de 1911, e num episódio em São Paulo.

 O dia era bastante aclamado na imprensa esportiva brasileira pelo fato de que o craque Pelé estava há somente quatro gols de fazer o milésimo. Enquanto isso, o delegado Sérgio Paranhos Fleury esperava ansiosamente a noite do dia 4 de novembro pra poder chegar ao inimigo número um da ditadura militar. O local da emboscada foi a Alameda Casa Branca e há alguns metros dali encontrava-se o estádio Paulo Machado de Carvalho, ou simplesmente, o Pacaembu.

 A partida teve entrada franca e as gerais lotaram fácil para assistir ao clássico. O Santos que vinha de um 4 a 1 em cima do Flamengo enfrentava o Corinthians que vinha de um 2 a 0 diante do Fluminense. Com o estádio lotado, torcedores que estavam nas gerais tiveram de invadir o setor das cadeiras numeradas e nisso um guarda civil foi atropelada pela multidão e caiu, se ferindo posteriormente. Mas se o Pacaembu vivia uma noite intensa, há uma pouca distância dali, na Alameda Casa Branca pairava a 'calmaria'. O fato ocorreu antes do apito inicial. Marighella compareceu a dita rua para encontrar-se com os frades dominicanos no fusca e foi surpreendido por tiros de Fleury e dos militares. Cerca de noventa minutos após o assassinato a imprensa pode saber do caso. Enquanto isso, no clássico, Ivair deu o pontapé inicial da salva de gols que o Corinthians viria a fazer, mais tarde com Rivelino em duas ocasiões e Suinge. O Peixe sobrou na noite com um gol de Edu, e Pelé teve de esperar quinze dias para alcançar o milésimo. 

 Marighella, corintiano que era - na Pauliceia -, ainda assim, morreu vitorioso.